segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

 

OS MUNICÍPIOS BRASILEIROS E OS PRECATÓRIOS JUDICIAIS

 

* Ivan Veronesi

 

            Muito se tem falado da crise financeira por que historicamente passa os Municípios brasileiros. Com todo o respeito que tenho por aqueles mandatários das comunas municipais que vieram com as melhores das intenções e contam com uma equipe especializada e competente, afirmo com todas as letras que, salvo raras e honrosas exceções, a maioria dos municípios brasileiros vive em constante aperto financeiro e quase não cumprem as metas ficais previstas[1] pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

        Ora, a falta de recursos financeiros vem de há muito tempo e podemos dizer sem exagero desde a época imperial e se acentuou após o regime republicano, quando os chefes dos Poderes Executivos começaram a ser efetivamente eleitos, embora manipulado por vícios, pelo voto direto da população brasileira.

        Os que estudaram Administração nas boas universidades ou são sensíveis ao comando de quaisquer organizações, sejam elas públicas ou privadas, sabem sobejamente que não se pode colocar o que é extremamente técnico sujeitando-se à injunções políticas indevidas, culminando com o comprometimento dos objetivos (eficácia) de uma gestão, com sérios prejuízos sociais ou da clientela envolvida.

        Evidentemente, entre outras razões, se o fulcro do problema não estivesse ligado à Administração Tributária dos três âmbitos (Federal, estadual e municipal), não teriam os técnicos/especialistas e os legisladores no Congresso Nacional se preocupado com a questão da arrecadação de tributos[2], vez que estariam convictos de que na medida em que houvesse crescimento econômico (PIB), automática e fluentemente aumentaria a Receita Tributária. O que lamentavelmente não é verdade!

           Claro fica que se os municípios tivessem, sem os vícios políticos, uma eficiente e eficaz Administração Tributária como já há muito prevê a Lei, teriam hoje condições de resolver inúmeros problemas orçamentários, em especial as inadiáveis pendências dos Precatórios. Existem inúmeros municípios brasileiros, inclusive de médios portes que por falta de estrutura real e dinâmica e servidores de carreira profissionalizados, não chegam a arrecadar, por exemplo, 1/5 (um quinto) do ISS (imposto sobre serviços) potencialmente existente na cidade. Simplesmente porque muitos Prefeitos fazem campanhas eleitorais (antecipadas ou não) com renúncia de receita hoje condicionadas a LRF[3] ou simplesmente negligenciam na arrecadação dos tributos próprios, daí porque são obrigados a se sustentarem dos repasses financeiros do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) ou na receita do ICMS dos Estados. 

           A história da estatística econômico/fiscal provou esta evidência, enquanto a população, os problemas sociais e de infraestratura de nossa nação crescem de forma geométrica, as receitas do Estado Brasileiro sobem aritmeticamente, sem contar o descontrole e os macros desvios financeiros provindos dos contribuintes, que a todo o momento tomamos conhecimento (ou não) através da “mídia”, quase todos não ressarcidos aos cofres do Governo. Por isto, o Estado brasileiro precisa lançar mão de medidas inadequadas (hoje condenadas), como o aumento de tributos, criação de novos e outros artifícios como “ajustes fiscais” de gabinetes ou cortes de despesas de cunho social extremamente necessárias à vida saudável da população. Para quem não conhece a administração pública ou nunca tratou com esta, o precatório é um título judicial representativo de uma dívida reconhecida pela Justiça.

                    Porém, como as dívidas acumuladas ano-a-ano são muitas, a maioria dos municípios não dispõe de todo recurso financeiro em um único exercício, pelos motivos expostos, por isso condescendentemente a CF faculta-lhes até 10 anos para cumpri-las, exceto os débitos de pequeno valor e de origem alimentícia[4].     

                 No dia 16 de dezembro de 2004 (DOU nº 241, Seção I, pág. 8), fomos surpreendidos mais uma vez com preocupações idênticas de outras épocas, só que agora com um “PACTO DE ESTADO EM FAVOR DE UM JUDICIÁRIO MAIS RÁPIDO E REPUBLICANO”, de conteúdo e validade jurídica discutível, firmados em seus próprios nomes, pelos Presidentes da República, do STF, do Senado e da Câmara Federal, vez que, com exceção do Presidente da República, os outros não consultaram os seus pares, já que se trata de órgãos colegiados com “status” definidos na Carta Maior. Neste indigitado “PACTO”, entre outras questões crônicas de relevância, no seu item nº. 6 foi destacado o seríssimo problema dos PRECATÓRIOS nos três âmbitos.

                Analisando bem o conteúdo do mencionado “Pacto” e o da Emenda Constitucional nº 45 de 30 de dezembro de 2004, nota-se que aquele inspirou o surgimento da referida EC que modificou em profundidade a funcionalidade e a estrutura do Sistema Judiciário Brasileiro. Resta saber se a categoria dos Magistrados federais e estaduais foram consultados sobre estas mudanças ou se foi neste país mais algumas daquelas que “sói acontecer” de cima para baixo, ou seja, enfiando “goela abaixo” restringindo e castrando legitimas conquistas, como no caso das trabalhistas que vem desde o aparecimento da CLT sancionada pelo saudoso Getúlio Vargas.    

 

* Ivan Veronesi é auditor aposentado, tributarista, especialista em Adm. Fazendária Municipal e professor.

                                                



[1] Ver art. 9º da LC 101/2003 e Comentários à LFR, págs. 85 a 88 de Carlos Maurício Figueiredo e outros, Edit.  Revista dos Tribunais, 2ª E. 2001.

[2] Ver artigo 10, incisos VII e X, da LIA (Lei de Improbidade Administrativa – nº. 8429/92); artigos 13 e 58 da LRF; artigo 37, incisos XVIII e XXII e artigo 52, inciso XV da CF/8 (acréscimos da EC 42/2003). 

[3] Ver artigo 14 da citada Lei Complementar.

[4] Ver arts. 100, 78, 86 e 87 (ADCT) da CF/88 e Súmula 655/STF.

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